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domingo, 31 de janeiro de 2010

Sem mais valia e sem arroz...


Esse fim de semana eu fui fazer um das coisas que mais me dá prazer nessa vida: falar com o povo.

Fui ministrar uma capacitação a uma paróquia sobre a Campanha da Fraternidade Ecumênica deste ano, sobre a qual falarei melhor em outro momento. A atividade foi realizada na Vila dos Cabanos, um bairro industrial habitado por funcionários da Vale do Rio Doce no município de Barcarena - PA. Amo pegar a estrada, amo olhar o visual e tudo, mas o motora que conduzia o ônibus parecia que tinha como único objetivo oganhar na corrida das tartarugas. Meu Deus do céu, como eu sentia vontade de descer e ir andando. Acho que chegaria mais rápido.

Durante a viajem, tive mais tempo do que eu merecia para me borrar de nervosismo pelo desafio que estava para enfrentar.

Primeiro: Era a primeira vez que eu falaria sobre o tema, e o faria para uma paróquia com 23 comunidades e mais de R$ 1500,00 em investimento.

Segundo: Eu tenho um corpo fransino, o que faz com que eu aparente ser mais novo do que eu sou. Só que além disso eu sou novo também, e isso gera muita desconfiança nas pessoas. Imagina só eu fazer um investimento da porra e chegar um moleque para ser o assessor? Assustador, no mínimo.

Ao chegar no local, eu dou alguns dos passos mais difíceis da minha vida. Consigo me lembrar de cada um deles até que alguém viesse falar comigo. E aconteceu de novo: percebi que o olhar dela era de reprovação automáica pela minha aparência, assim como o de todos. O desafio era maior do que eu esperava, inclusive, porque quando vi o público chegar percebi que a maioria eram pessoas idosas, muito diferente do que estou acostumado a falar. A atividade atrasou, o que me deixou muito aliviado porque seria menos tempo de batalha, e assim, caso fose um fiasco, eu seria enterrado mais cedo.

De que forma falar de economia e todos os termos complicados envolvendo o assunto para pessoas que provavelmente nunca ouviram falar de Adan Smith, Engels, Keynes e companhia? De que forma falar mal das grandes empresas a pessoas que são exploradas pela Vale e não sabem? De que forma falar de ecumenismo pra pessoas condicionadas a achar que só através de sua forma de viver a fé há salvação?Simples: simples. Mais carne, menos gordura.

Quem fala em público precisa ter uma sensibilidade incrível para saber quando está sendo chato, quando tem que enfiar uma piadinha pro povo acordar, quando tentar falar alguma coisa que chame a atenção daquela pessoa lá no fundo meio desinteressada sem precisar ser inconveniente. E eu venho tentando desenvolver isso. Técnica que nos permite também saber a hora que temos de calar a boca e quando o que estamos dizendo está causando algum efeito no coração de alguém, pois a única parte do corpo que não aprende a mentir são os olhos. E quando bem na minha frente eu vi os olhos de um senhor lagrimarem quando falei sobre a importância da gratuidade, meus olhos devem ter devolvido para aquele senhor uma mensagem de alívio e satisfação.

Consegui! Não fiz aquela gente que veio de tão longe perder a viagem. Não fiz os organizadores passarem vergonha diante do povo.

"Meu filho, parabéns! Você falou bonito e de um jeito muito simples. Obrigada", disse uma das cursistas, a exemplo de muitas outras pessoas . Também dei meus msn e número de telefone pra algumas meninas (porque ninguém é de ferro). Foi a primeira vez que fui aplaudido de pé. Mas o que me deixou feliz mesmo, foi ver o entusiasmo das pessoas em sair por aí e levar a frente a campanha, inclusive ecumenicamente. Ou seja, saber que tudo o que recebi foi resultado de algo que dei. Não há nada mais gratificante que um salário justo, sem mais valia e sem "arroz"*; alías, as coisas boas da vida são assim mesmo, dadas de graça, como aqueles olhares que levarei comigo o resto da vida.
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* Termo utilizado para denominar atos indecorosos do empregado para com o patrão, como roubar mercadoria.
Foto: Google.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Acerto de contas

- Eu vim aqui pra te dizer que já entendi tudo. Você só queria me usar, se aproveitar de mim. Fingia muito bem ser carinhoso, e até falava todas aquelas declarações de apaixonado, mas eu sei que você deve dizer isso pra todas; imagino até que você já tenha todos aqueles versos dec[ - Oi.]orados, mas... ah, oi.
- ...

- Eu me envolvi. Aceitei todos os seus defeitos, e olha que não são poucos. Até mesmo contra a miha família eu estava disposta a lutar, e olha que nunca f[ele olhando de forma cínica para os seios dela]iz isso por ninguém e... . O que foi?
- Saudades.
- Vai começar?
- Desculpe, continue (com sorriso maroto).
- Pensa que eu não sei qual é o seu jogo? Eu fui só mais um troféu pra você. Quando você viu que eu já estava caidinha por você, devo ter perdido a graça. Meu Deus como fui b[olhar convenientemente surpreso dele para o "v" olume no short jeans lycra dela]urra! (constrangida, mas tentando disfarçar) Você pensa que só porque tenho esse jeito meigo eu iria viver atrás de ti? Pois tá enganado. Você sumiu, mas eu só vim aqui te d[ - Ele é bonito?]izer...
- quem?
- O carinha lá...
- Por que quer saber?

- Ele é?
- É lindo.
- Ele é inteligente?
- É.
- Tava com saudades de ti.
- ...
- Eu vou embora. Já vi que perco tempo com você.

Ele a abraça forte por trás. Ao encaixar os braços em volta dela, sussurra no ouvido:
- você veio dizer tudo isso pra mim ou é a ti mesma que tenta convencer?

- vai me soltar ou eu vou ter que gritar?
- Desculpe. Não faço mais.

Ela anda dois passos, e, com a força que ela sempre gostou, ele a abraça forte. E por um instante, a moça não consegue distinguir se a avenida dos sonhos que ela caminha semi-acordada é para uma subida ou a uma ladeira.

Quando ela finalmente consegue ter forças pra falar alguma coisa, diz:

- Eu já perdi muito do meu tempo chorando por tua causa. Me sinto amada agora, e vim aqui pra ter certeza quevocê não passa de um fanthmmmmmf hmmmmmmmmmmmf hmmmmmf

...

- Desculpe (olhar cínico). Dessa vez é de verdade. Prometo que não faço mais.

- Tchau.


- Eu gostei.

- Até nunca mais.

- Diga que não gostou.

- ...

Ele grita:

- Eu pedi um tempo, mas foram os seus medos que disseram o "não" mais demorado. Quando a mentira deixar de ser cômoda pra ti, venha desnudar a verdade comigo. Eu rasgo a calcinha dela, e quem sabe você não arranca com os dentes a sua cueca. Certeza é aquele velho caduco daquela esquina qualquer. Lembre-se disso

- ...


.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Quem não mente não vira gente


Você não mente? Mentira. Todo mundo mente.

A mentira é um mecanismo de controle social em nossa sociedade, e ainda que o nosso código moral condene a mentira oportunista, ou seja, aquela que machuca, fere, causa dor e/ou algum tipo de dano, não é possível que uma pessoa viva em paz socialmente se ela não souber mentir.

A falsidade, por exemplo, é o apelido da simpatia, mas em contextos iguais ou diferentes, ambas utilizam-se da mesma ferramenta para diferentes fins.

Uma pessoa com o cabelo ressequido chega num dado ambiente. "Nossa amiga, mas que lindo o seu cabelo", seria um dos comentários típicos de mulheres cujo veneno escorre involuntariamente pelo canto da boca. Mas também pode ser o mesmo comentário de uma pessoa que, mesmo achando o cabelo da pessoa em questão horrível, não se sente bem em utilizar-se de uma "sinceridade inconveniente", e prefere ser, digamos, simpática. Nem uma falaria a verdade, e, do mesmo modo, ambas concorreriam ao Oscar de melhor atriz - uma como mocinha e outra como vilã.

Aliás, o saudoso Paulo Autran, considerado o melhor ator que esse país já teve, costumava dizer que todo e qualquer ser humano atua, o que diferencia um ator profissional é que ele consegue fazer isso num palco ou diante de uma câmera. Diante do chefe não somos da mesma forma que diante do namorado. No frente da sogra somos Assim, pelas costas de réia somos assado. Ninguém é 100% "assim" o tempo todo, tudo depende do contexto. Podemos dizer que desde criança, por um questão de sobrevivência em sociedade, somos acostumados a selecionar as verdades a dizer ou a demonstrar, ou mesmo as verdades que temos de criar.

Eu costumo dizer que se eu não soubesse mentir, eu ainda seria virgem, e se mulher não mentisse, não haveria rentabilidade para motéis.

Imagina só um convite assim:"Meu bem, vamos foder hoje?" Raramente funcionaria. Mas se ele chama pra "jantar", as chances dele aumenta. E se ela por um acidente do destino perguntar se ele a convida somente porque quer sexo, ele jamais poderá confirmar. É um a espécie de princípio do jogo do sexo.

E entre agarros e gemidos a coisa funciona geralmente assim:

Não.
Pára.
Não.
Pára.
Não pára
nãopáranãopáranãopára...

Quem não lembra do Chicó do Auto da Compadecida e suas mentiras? Ariano Suassuna se baseou em figuras muito comuns no interior para criá-lo. Por aqui, chamamos esse tipo de gente de Potoqueiros (quem conta potoca). Em uma entrevista dada ao Jô, Suassuna comentou sobre o caso de um Chicó da vida que contava suas mentiras para um público muito atento, quando um forasteiro, se valendo de sua "genialidade" questionou a inteligência do povo ali atento a acreditar em tudo; aí um virou pra ele e falou que só uma pessoa muito abestada pra não entender que todo mundo sabia que era mentira, e exatamente por isso estavam ali.

Segundo Mario Quintana, a mentira não passa de uma verdade que não chegou a acontecer. Não a condenemos assim tão genericamente, pois ela é muito útil de quando em vez.

...

Top 10 de pessoas que (nem que seja láááááá no fundo) adoram mentira:

01º - Corno Manso (te faz de doido e conta pra ele)

02º - Mulher de safado ("prometo que essa foi a última vez")

03º - Dizimista (porque o céu é baratinho)


04º - Eleitorado brasileiro (...)

05º - Mãe (Quem nunca mentiu pra mãe não herdará o Reino dos Céus)

06º - Chefe (viva o caos no trânsito)

07º - Mulher sexualmente reprimida ("finge que não quer ou não poderei querer")

08º - Amigos pré-adolescentes ("Cara, eu comi umas dez já"; "Tá fraco ainda, eu comi 20")

09º - Cliente ("Você é muito especial para nós")

10º - Pessoa rica ("Pra quê me preocupar com a vida real se eu posso comprar fantasias?")
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Foto: Google

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Ditados Pós-modernos - antalogia

Em homenagem a minha amiga Ananda que em breve partirá para novos horizontes, apresento aqui a antalogia (de anta mesmo) de uma brincadeira que fiz aqui neste espaço ano passado, doidice que ela gostou muito. Apresento o melhor das duas postagens com este tema e mais algumas inéditas, porque as vezes é bacana a gente se sentir inútil...

  • Depois que inventaram essa palavra "pós-moderno", a gente não pode mais chamar ninguém de idiota
  • Pica grande, buraco pequeno, tanto cuspe até que entra
  • Quer saber como ela ficará no futuro? Olha se ela terá grana
  • Cada um por si e Deus por mim
  • O último que sair tecle Alt + F4 e depois Enter
  • Em terra de hétero, quem se assume é rei
  • Uma safada só não faz orgia
  • A voz do povo é a voz da Globo
  • Não sabendo que era pecado, ela foi lá e deu
  • Quem tem grana vai a Roma
  • Os acomodados que se mudem
  • O que os olhos não veem o cu sente
  • É com patetas que elas casam mais
  • Apressado fode em pé
  • Quando a esmola é demais, o povo faz fila
  • Quem brinca com fogo acaba engravidando
  • Entre padres e pastores não ressuscitou ninguém
  • Quem quiser bem feito que pague
  • Manda quem pode, obedece quem quer o emprego
  • A ocasião faz a traição
  • De preconceituoso e demagogo todo mundo tem um pouco
  • De "meu amor" em "meu amor" a menina enche o saco

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Haiti


Crianças desesperadas gritando por suas mães enquanto muitos pulmões se exaurem entupidos de poeira. Desespero. Concreto.

Países sanguessugas mandando ajuda fantasiados de solidários como se o terremoto no Haiti não tivesse começado desde que Colombo pisou ali. América? América.

Gente se vestindo de seres humanos enquanto a próxima sensação da mídia não chega, mostrando quem sabe o fim do desrespeito à soberania do Haiti. Assim.

Lágrimas já tão comuns no país mais empobrecido da América caindo recheadas com perguntas do tipo: Porque eu? Por que nós? Por que aqui?

O planeta se contorcendo de dor, coitadinho, sem perceber que acaba as vezes machucando aqueles que menos tem culpa.

Pessoas caminhando para lugar nem um, como se todos os caminhos que antes pareciam estar fechados simplesmente tivessem desaparecido. Do nada. O nada.
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Foto: i Fotogaleria

Para saber mais:

Agência_Brasil_de_Fato

Wikipedia

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

A Igreja como ela é

A partir de hoje, de vez em quando eu vou contar histórias que catei nos "bastidores" das mais diversas denominações cristãs. Não revelarei nomes nem locais precisos, ao mesmo tempo em que não inventarei nada além disso. Será uma postagem ecumênica, quebrando assim qualquer barreira denominacional que possam distinguir qualquer coisa de qualquer coisa a respeito disto.

Inspirado na Obra de Nelson Rodrigues, eu também digo que não é exatamente com satisfação que afirmo o presente conto da vida real e dou fé, pois no fim, são histórias (quase) como todas as outras...


Mocidade

Chegaram praticamente juntos ao Culto da Mocidade. Já se conheciam de vista, mas como chegaram atrasados e ficaram longe de onde estavam sentadas as "panelas" de cada um, começaram a conversar. No início era um papo trivial, até que o olhar de um para o outro passou a ser a comissão de frente de uma porção de alas com fantasias aparentemente exóticas para aquele ambiente. Houve momentos em que um chamou o outro pra falar nada de importante, apenas para não deixar aquele desfile com coreografia improvisada acabar.

Ao fim do culto, descobriram que moravam perto um do outro, então, acabou ele indo para a casa dela. Ela estava só em casa naquela noite. O pai da moça era vigilante e a mãe dela estava viajando. Os dois entraram, e da feita que fecharam o portão estavam num pátio isolado da rua. Na porta da sala, os dois deram continuidade ao desfile iniciado outrora, e apesar da pausa gritante entre a alegoria anterior e a de agora, é possível dizer que não perderam nem um ponto no quisito harmonia. O beijo aconteceu de forma tão envolvente e ao mesmo tempo tão automática que nem um dos dois soube dizer como foi exatamente que chegaram ali.

Ao fim do primeiro beijo, perceberam que cada um ainda estava com a bíblia na mão, e foi dela a iniciativa de colocar as duas bíblias no canto da porta. O segundo beijo, não se sabe se pela atitude anterior dela, ou por qualquer outro motivo, foi bem mais pegado. Ele ficou excitado, e ela, se já não estava, ficou ao sentir a pressão dele contra ela. A mão dele desceu até o quadril dela, e com uma força moderada a puxou contra ele, talvez pra fazer ela sentir ainda mais a pressão, ou porque a pressão que ele dava era uma forma de aliviar um pouco da dele. Os dois continuaram se beijando; um beijo cada vez mais ardente, e após a mão dele percorrer uma deliciosa trilha pelo corpo dela, a mão dela foi a porta estandarte da noite.

No início ele não entendeu porque ela tentou colocar a mãozinha por dentro de sua cueca, na verdade no início ele achou bem estranho. Ela fez duas tentativas, e na segunda, por instinto, ele percebeu o que ela queria. Ele então encostou seu mundo no dela, ainda que o mundo dela ainda estivesse coberto pelo último manto, o que não os impediu de experimentar uma pequena porção do paraíso. Quando aquilo já estava passando daquilo que ela se permitia fazer naquele momento, ela o afastou, e mentiu dizendo que seu pai estava para chegar. Ele então pegou a sua respectiva bíblia (meio contrariado pelo fim, mas muito mais satisfeito pelo caminho percorrido) e saiu pelo portão, dando-lhe um beijo de despedida. Depois ela pegou sua respectiva bíblia e entrou também. Entretanto, talvez eles tenham demorado um pouco mais para voltar ao mundo que conheciam de cor. Palpite meu.


PS: Nem todas as histórias em meu "banco de dados" são tãããão suaves assim...

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Amor à primeira vista


Alguém acredita em amor a primeira vista? Eu acredito. Aconteceu comigo.

Foi na sexta série. No primeiro dia de aula reencontrei com meu melhor amigo daquela época, Joilson. Ele foi logo dando um aperto de mão firme e me puxando pra ir ao segundo piso da escola.

"Vamos lá em cima que tem uma baita duma gata lá", falou ele com o sorriso maroto e um entusiasmo de sempre.

Quando chegamos lá, com um frio na barriga confirmei que ele não havia exagerado. Era realmente linda. Uma morena com lábios carnudos e olhos verdes.

Nos olhamos ao mesmo tempo. Meu coração pulsou imediatamente, e só anos mais tarde eu fui entender aquele sorriso oferecido a mim com cobertura de olhar docemente delicioso. Era o sinal de que o coração adolescente dela também pulsou ao me ver.

Não lembro de todos os detalhes, mas recordo de nos colocarmos numa típica situação de adolescentes enamorados, em que muitas brincadeiras são feitas como uma forma de reagir ao sentimento naquele momento completamente alienígena, principalmente para os meninos que amadurecem bem mais tarde em relação às meninas. O Joilson, sem vergonha como era, começou logo a tirar brincadeiras com ela, e me incentivava a embarcar nelas. Numa dessas brincadeiras-de-adolescentes-sem-jeito, naquele mesmo dia, findamos ele e eu cada um segurando um dos braços dela. Ela o repeliu com uma certa ignorância, e a mim não. Segurou na minha mão e sorriu. Eu fiquei sem graça pelo Joilson, que logo reconheceu o que estava rolando, e ao mesmo tempo fiquei com uma sensação de paz no coração enquanto largava suavemente os dedinhos dela.

O que fiz depois? Ah eu... lógico que eu... fugi de lá (também não foi correndo!).

Minutos depois alguma amiga dela foi à minha sala, e sem o professor perceber me disse nitidamente pelas frestas da parede de tijolos furados: "A Dani te ama!".

Quem é Dani? O que é amar? Será que Dani é aquela morena de olhos verdes que me olhou daquele jeito intimidador minutos antes? E por que eu me sinto estranho quando estou perto dela?

O amor de adolescente não é lindo? É mesmo. O amor de um adolescente tímido é tão inexplicável e sublime quanto qualquer outro, mas bem mais assustador.

Como podem imaginar, eu não aproveitei esse amor à primeira vista. A beijei (fui a primeira pessoa a beijá-la), mas por não ter a mínima maturidade pra entender aquele gostar, fugi dela como eu pude. Fui um bixo-do-mato minha adolescência inteira. É pena mesmo. Mas aquele primeiro encontro, aquele primeiro olhar, aquela sensação desvirginadora de beijar alguém que quer mesmo seu beijo, são coisas que marcaram muito a minha vida; lembranças guardadas no meu relicário de sensações lindas.

Minhas últimas palavras eu gostaria de dedicar à Dani, que provavelmente nunca vai ler, mas temos que acreditar no milagre da internet:

Dani, se eu fui o primeiro a te beijar, seus lábios foram os primeiros a me fazerem levitar. Eu vivi e você também deve ter vivido muitos amores, mas à primeira vista, só aquele encontro, só aquele olhar nos proporcionaram.

Beijos incandescentemente adolescentes!

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

O Novo e o Velho


No meio de uma ponte encontraram-se dois velhos amigos que não se conheciam. Um era conhecido por Ano Velho, embora tivesse ressalvas quanto a essa graça. O outro era conhecido como Ano Novo, nome pelo qual sentia generosa dose de satisfação. No ato do encontro muito barulho se fez, e enquanto a luz das expectativas parecia pipocar no céu, a ponte deixou de ser intercessão e virou a alameda das lembranças comuns.

O entusiasmado ano novo parecia indiferente quanto ao visível cansaço do ano velho.

- Eu vou ser o que você não foi. Afirmou com o semblante radiante de soberba o Ano Novo.

- Eu também disse isso, meu filho. Respondeu o Ano Velho após a típica ofegada delatora de enfermos.

- O que são essas manchas em você? Perguntou o Ano Novo, que pela primeira vez notara de verdade a velhice do ano velho, estado que para ele não deveria estar tão avançado assim.

- São as manchas da derrota recorrente, das sementes que não germinaram. Árvores que deveriam escrever flores de Copenhague e só gritaram frutos de egoísmo mórbido, gente que deveria ao menos brincar de vida mas só quiseram levar a sério a morte, verdades de paletó sem talento até para ser mentira, chances travestidas em verdadeiras miragens, e uma distância ainda mais enorme e cruel entre os perfumados e suados. Respondeu o Ano Velho.

- Mas você não está só mancha, há muito de vistoso e virtuoso em você. Comentou Ano Novo, enquanto escandalosamente notava pequenas manchas em seu pulso esquerdo.

- Essas manchas são hereditárias. Você herdou da incompetência de seus antepassados, e está propenso a repassá-las se não parar de ser o mais como propriedade exclusiva do mesmo.

O Ano Novo continuou então seu caminho. Num dado momento notou como é quase impossível ser o que jamais foram os anos anteriores, mas continuar não era algo negociável, ele tinha de avançar no tempo e não sabia (nem conseguiria) fazer diferente algo diferente disto. Continuou então observando atentamente nos quadros, nas páginas e nas partituras as novidades absolutas.

- Por que já no início do caminho um dos jardins da esperança foi inundado? Será algo de podre no Reino da Dinamarca? Será? Questionou-se o vigoroso Ano Novo enquanto continuava seu caminho, no trecho ladrilhado por blocos de otimismo.